quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

anestésica vida

ela entrou no recinto e fitou o espelho. recuperou um mistério, um brilho no olhar. desbravou o infinito nexo causal entre os cílios superiores e inferiores - esse cosmo colorido que há entre eles. no fundo da íris arcos, no fundo dos arcos olhos. do rosto molduras, silhuetas, partituras. essa sensação de sentir as árvores balançando com a velocidade do coletivo, o vento batendo no rosto e de se sentir viva, muito viva, viva pra caralho. no fundo das gavetas que precisava arrumar, achou sorrisos injustificáveis. gargalhadas de perigo. e dos sapatos que precisava tirar a lama, encontrou metros, milhas, quilômetros, achou pés. pra andar por aí nesse mundo e sentir o que é teu. e deixar ir tudo aquilo que nunca foi. encontrou uma felicidade aguçada. era como se tivesse despertado de um sono de domingo, oblíquo, leve, quase que embaçado. como se pela primeira vez entendesse a completude - só que não era, já sentira esses suspiros antes por si mesma em outros tempos só que diferente. era como fitar um lago gelado e profundo, mas dessa vez submergir e se perceber em águas quentes. impetuosas, porém de delicadeza insustentável. sentia a potência de uma vida. talvez de outras, das que já tinha ido. talvez pressentisse as que ainda viriam. recém-nascida de uma anestesia: abriu as janelas e encontrou o delírio.

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