terça-feira, 6 de outubro de 2009

o ônibus passou pela ponte.

lá embaixo, o mar refletia o dourado do sol em rajadas de cores azul-prateadas. o vento bagunçava os cabelos e a música ressoava.
ela se aproximou com suas roupas de estampas simplórias. sentou-se na minha frente, nos bancos reversíveis. fitou a minha boa aparência, olhou até com desprezo. seu suor reluzia àquela luz, juntamente com a sua aliança de ouro barato. mas passaram-se dez minutos e ela caía num sono profundo como o dos anjos. seu semblante sofrido, adormecia em plena paz; suas mãos de trabalhadora demonstravam o cansaço e a luta do dia-a-dia. abraçava a bolsa, o pouco que deveria ter, num gesto protetor e acalentador.
comecei a pensar nos caracteres daquela jovem senhora. deveria ter no máximo 35 anos, mas as linhas de expressão já delineavam o rosto. teria filhos? um, dois, três, quatro, nenhum? teria pais ainda? seria casada? teria alguém e algo pra chamar de seu?
há tantas pessoas por aí; tantas mãos como aquelas, que refletiam o suor do trabalho. tantos que trabalham tanto, e que mesmo assim conseguem adormecer com a paz do cansaço celestial do fim de um dia, dentro do ônibus, no meio de tanto barulho e pessoas.
levantei e dei o sinal, era o meu ponto. o dela era bem mais longe. quem sabe numa mansão, num lugar melhor que o meu; quem sabe no fim da linha, onde há um boteco sujo de esquina, uns vira-latas correndo pela rua, um lixão a céu aberto e um barraco cheio, completo de alegria. e lá se foi minha companheira de viagem, dormindo no seu sono angelical com seu suor reluzente.

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